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segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Desistir de um aluno


Por Leandro Karnal

Uma vez escrevi para um congresso sobre a aproximação entre o método materno e o pedagógico. O texto que fiz era o seguinte:

Hoje, eu acho que ser paciente é a maior virtude do professor. Não a clássica paciência de não esganar um adolescente numa última aula de sexta-feira, mas a paciência de saber que, como diz Rubem Alves, plantamos carvalhos e não eucaliptos. Nossa tarefa é constante, difícil, com resultados pouco visíveis a médio prazo. Porém, se você está lendo este texto, lembre-se: houve uma professora ou um professor que o alfabetizou, que pegou na sua mão e ensinou, dezenas de vezes, a fazer a simples curva da letra O. Graças a essas paciências, somos o que somos. O modelo da paciência pedagógica é a recomendação materna para escovar os dentes: foi repetida quatro vezes ao dia, durante mais de uma década, com erros diários e recaídas diárias. As mães poderiam dizer: já que vocês não querem nada com o que é melhor para vocês, permaneçam do jeito que estão que eu não vou mais gritar sobre isso (típica frase de sala de aula...). sem essas paciências, seríamos analfabetos e banguelas. Não devemos oferecer ao nosso aluno, especialmente ao aluno que não merece e nem quer esta paciência – este é o que necessita urgentemente dela. Doente precisa do médico, não o sadio. O aluno-problema precisa de nós, não o brilhante e limpo discípulo da primeira carteira.

É um erro que já cometi muito. Um aluno não me ouve. Não faz nada do que eu peço. Diante de qualquer tentativa, sutil ou forte, ele reage com indiferença absoluta. Eu insisto, chamo para conversar, estimulo, repreendo. Nada. Absolutamente nada. Todos os colegas dizem o mesmo: “esse aí não quer nada com nada”.

Parece que o aluno, o Dna, os colegas, o sistema e tudo o mais indicam que devemos desistir. Afinal, o que eu posso fazer com apenas aquele tempinho e tendo tantos estudantes para atender? Nesse momento, queria dizer para mim e ler muitas vezes para mim e aproveitar para dizer a vocês: não desistam. Desistir de um aluno e declarar que nada mais pode ser feito é um fracasso doloroso para todos, para o professor inclusive. Acho que há momento para desligar as máquinas num centro de tratamento intensivo. Acho que há momentos em que a doença vence. Mas gostaria, na minha vida profissional, que eles fossem escassos. É a vitória da morte, num hospital ou numa sala de aula.

O mais dramático é que, por vezes, é o aluno que nos pede para desistir. Ouvi tanto isso deles. “Não adianta, professor. Eu não quero aprender...” encare sempre esse desafio. Quem não quer é o que mais precisa. Volto para a escova de dentes...

Leandro Karnal é professor, historiador, graduado em História pela UNISINOS e doutor pela USP. Atualmente leciona na UNICAMP. Será palestrante no Encontro Nacional de Mediação de Conflitos – CEAT/2013, em Lajeado/RS.

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